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Foto do escritorSamantha Oliveira

"Fale Comigo" é um bom terror, mas falta a mão do roteiro


Menino possuído segura mão embalsamada em uma mesa
"Fale Comigo" estreou no Festival de Sundance 2023 | Foto: Divulgação/A24

O que uma mão embalsamada que mais parece com o Mãozinha da Família Addams pode entregar em um filme? Em "Fale Comigo", novo longa de terror que chega aos cinemas nesta quinta-feira (17), a parte do corpo assombrada surpreende ao mostrar que pode assustar como um simples aperto de mão.


A trama se apresenta como algo simples: o público acompanha um grupo de jovens que resolvem ‘brincar’ com a tal mão embalsamada - e obviamente a situação sai do controle. Porém, sob as mãos dos diretores Danny e Michael Philippou, "Fale Comigo" consegue se sobressair em meio aos erros comuns do gênero e mostrar sua própria assinatura.


A surpresa inicial começa nos primeiros minutos do longa, ao mostrar uma sequência curiosa e angustiante que pode ser uma das justificativas para o barulho que a película tem feito desde que estreou no Festival de Sundance, em janeiro de 2023. Aqui, os diretores conseguem mostrar a que vieram e um gostinho da grafia visual que está por vir.


Um destaque para Sophie Wilde, que vive com maestria a protagonista Mia - até então uma jovem adolescente com problemas comuns: luto, daddy issues e aquele desejo reprimido de talaricar a amiga. E, falando em luto, esse é um dos pilares da trama, que é usado quase que exaustivamente para justificar as decisões questionáveis da personagem.


Do Youtube para o Snapchat


uma mulher, negra, cabelos curtos. está sentada em uma cadeira, com a cabeça completamente para trás, boca aberta e olhos quase completamente pretos. ela usa um roupão amarelo.
Sophie Wilde como a protagonista Mia em "Fale Comigo" | Foto: Divulgação/A24

É necessário destacar como o trabalho inicial de Danny e Michael Phillippou com curtas de terror Youtube influenciou para a linguagem de "Fale Comigo". Isso porque, além de independente, o filme consegue dialogar e representar bem a geração de jovens atuais. Seja pela constante presença - e influência - das redes sociais na trama como no uso da linguagem neutra e dilemas atuais dos personagens. Afinal, estamos falando de um filme independente australiano e de baixo orçamento que tem a habilidade de fazer o espectador se sentir imerso naquele universo.


A experiência dos irmãos australianos no terror também faz com que não só a mão embalsamada como os efeitos práticos do longa tragam uma assinatura própria à obra. Um destaque também para a maquiagem que consegue causar desconforto, ansiedade e medo - que traz um bom resultado para filmes de terror.


Esse resultado positivo também se vê na técnica do longa, em especial na cena em que a mão amaldiçoada é usada incessantemente durante uma festa - em uma clara associação às drogas. Nesse momento, a montagem, trilha sonora e direção convergem para o “vício” no oculto e uma porta de entrada para as decisões erradas.



Uma mão tem cinco dedos


Mão embalsamada em cima de uma mesa com uma vela acesa
Cena do filme "Fale Comigo" | Foto: Divulgação/A24

O maior problema de "Fale Comigo" está justamente no que não é sobrenatural. Nas pessoas e tensionamentos reais. Mia, apesar de ser uma personagem carismática e fácil de ser acompanhada, possui um destaque excessivo em detrimento dos demais. Sua relação passivo-agressiva com a suposta melhor amiga, Jade (Alexandra Jensen), e um ex-affair que está por perto o tempo todo, poderia ter melhor desenvolvimento até para acrescentar mais camadas ao grupo principal - o que não aconteceu.


Em certo ponto, após as decisões clássicas para que um filme de terror tenha andamento, os personagens ao redor de Mia parecem descartáveis, mesmo que tenham tido influência total no grande desastre do filme. Uma cena em específico mostra literalmente todos eles dando as costas para que as duas melhores amigas ‘se virem’ com a situação. De fato, uma mão não lava a outra.


Fala que eu te escuto


O filme se utiliza de temas comuns ao universo do terror, tendo o luto e a culpa como os principais - que permeiam todo o filme e o desenvolvimento da protagonista. A escolha de narrar o ponto de vista de Mia é interessante ao ponto de que acompanhamos o desenvolvimento da personagem e a sua relação com o oculto, que serve como consolo à medida que a sua ‘situação espiritual’ afunda proporcionalmente.


O sub plot twist envolvendo a mãe de Mia e o desfecho da personagem principal podem ser lidos como previsíveis para os mais acostumados com o gênero do terror. Porém, no geral, não tiram o mérito da obra - que consegue trazer recursos já vistos, ao mesmo tempo que fortalece seu nome com uma identidade própria.

Com toques de "Morte, Morte, Morte" e algum genérico de tabuleiro de Ouija, "Fale Comigo" é um bom filme de terror e mostra seu valor ao ser creditado como um dos melhores do gênero de 2023 (já que a concorrência não está lá essas coisas).


Veredito: 3,5/5


 

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