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Foto do escritorThallys Rodrigo

"It’s My House": A Brota Produtora e a cena noturna LGBTQIA+ no Recife

Atualizado: 28 de jun. de 2023

Produtora recifense tem sido local de entretenimento e conforto para LGBTQIA+s


Como diria Beyoncé no disco “Renaissance”, às vezes as pessoas só querem se sentir confortáveis com quem são e se jogar na pista de dança sem preocupações.


Esses, inclusive, são desejos muito comuns em quem é da comunidade LGBTQIA+. Mas, em um país hostil e LGBTQfóbico, nem sempre seus membros encontram meios de se expressar sem discriminação.


As oportunidades de divertimento são por muitas vezes limitadas por conta da falta de segurança ou da falta de identificação dentre as opções. Entretanto, na noite recifense, de diversas formas, a presença LGBTQIA+ persiste, e a Brota Produtora é um dos expoentes que mais vem se destacando no último ano.


Criada em 2021, a Brota tem realizado eventos de diversos enfoques, se solidificando como uma importante contribuição para a comunidade LGBTQIA+, chegando a receber, em junho de 2022, uma homenagem na Câmara Municipal do Recife por sua contribuição.




Por isso, o dia 20 de janeiro é uma data bastante especial para a produtora, que realiza o Baile da Brota, em comemoração de 1 ano de suas atividades.


“Saia do caminho. Estou com minhas garotas e todos nós precisamos de espaço”

- Beyoncé e Grace Jones na música “Move”


Não é novidade que lazer e entretenimento cumprem um importante papel para a saúde mental, especialmente em momentos de incertezas políticas e sociais, como o que foi enfrentado no ano eleitoral de 2022. Para a comunidade LGBTQIA+ não é diferente, e além do divertimento e “alívio” do dia-a-dia, programas noturnos possuem um importante papel na integração e socialização dessa comunidade.


Isso é o que destaca a auxiliar administrativa Pammela SOBRENOME, 28, frequentadora das festas da Brota. “É o único momento que a gente se sente à vontade, né? Para se divertir, adquirir mais conhecimento através de conversas, de saídas, e assim, a pessoa tem um lazer, autoconhecimento”, destaca.


Thiago Soares, professor do Departamento de Comunicação da UFPE, aponta que a relação próxima da comunidade com a cena noturna tem uma de suas origens nas barreiras sociais enfrentadas pelos membros.


" Se a gente pensar que o cotidiano familiar é marcado por conflitos, por relações conflituosas, maternas, paternas, muitas vezes dificuldade de aceitação, a noite acaba sendo um espaço de utopia, de acolhimento e, portanto, de resistência”, afirma. “A amizade, o encontro festivo, ele vai num lugar muito importante dentro dessa rede de acolhimento" – Thiago Soares


Muitas oportunidades na capital pernambucana para quem é LGBTQIA+, estão concentradas por volta do centro do Recife. Alguns exemplos de locais nesses arredores bastante frequentados por membros da comunidade são o Club Mix, Iraq Club e a Casa Bacurau,. Porém, talvez nenhum desses seja tão conhecido como a Rua das Ninfas, no Bairro da Boa Vista, lar de locais como a boate Metrópole e do Bar do Céu.



“Eu sei que ali muita gente é que está se descobrindo, se descobriu há pouco tempo, está indo, está gostando e está tendo um acesso legal ali, mas eu acho que as festas noturnas voltadas ao público LGBTQIA+ estão muito concentradas naquela região, na Boa Vista”, destaca o estudante de jornalismo Humberto, 21.


O professor Thiago Soares aponta que a cena de festas LGBTQIA+ na Região Metropolitana do Recife existe há décadas, dividindo-se entre clubes e festas. Entre a década de 90 para os anos 2000, destacaram-se boates como a Butterfly e a Araras, mais voltadas para o público de classe média alta.


Nas periferias, havia menos distinção de espaços, e festas do público heteronormativo costumavam também se tornar espaços de socialização LGBTQIA+.


Thiago relembra ainda uma retomada na tradição de festas voltadas para esse público, ocorrida entre 2005 e 2010, rivalizando com as boates. “A festa pode estar num lugar fixo, mas também é muito itinerante, então ela assume diferentes lugares e acaba tendo um pouco essa dinâmica de assumir várias facetas”. Nesse período de retomada, o acadêmico destaca festas como a Carola e produtoras como a Gola Rolê.


A diversidade dentro da cena LGBTQIA+ atualmente é um tópico que merece destaque. “A cena de Recife não tem uma só, têm diversas e isso serve pra provar que esse grupo na realidade é de fato diverso”, destaca o professor Yhann SOBRENME, 22. “O rolê se concentra muito nesse lance de você ir lá, beber, dançar. Talvez poderiam ter algumas propostas mais diversificadas nesse sentido. Mas eu acho que a gente tem festa pra todo tipo de música”, destaca.


“A cabine do DJ está realizando um teste de solução de problemas de todo o sistema”

- O artista Foremost Poets em “Moonraker”, canção sampleada em “Alien Superstar”, de Beyoncé


Apesar da relativa pluralidade da cena recifense, os frequentadores destacam uma desaceleração recente em eventos, com a Brota Produtora tendo um importante papel na retomada. “Depois da pandemia deu uma grande esfriada”, destaca o estudante de análise e desenvolvimento de sistemas, Eduardo SOBRENOME, 24. “Grandes produtores pararam de fazer festas e a Brota realmente surgiu pra fazer acontecer”, afirma ele.


DJ, produtor e CEO da Brota, Vands já havia criado outras iniciativas festivas como a DIP. O ímpeto do nascimento para a produtora, além da oportunidade de poder lançar novos selos, foi a vontade de gerar um impacto ainda maior na cultura local. Em seu Instagram (@brotaprod), a produção manifesta o desejo de ajudar a construir uma cena noturna mais “plural e democrática”.


"Essas duas palavrinhas têm um peso muito importante em tudo que pensamos dentro da produtora. Se você observar nossos line-ups, nossos selos, nossa equipe e até os locais que fazemos as festas, você enxerga pluralidade. Tudo é feito por uma juventude que pensa junto com a marca, da equipe ao público" – Vands

Nos últimos meses, a Brota realizou festas em locais diversos, como o Arruda, na Zona Norte do Recife, e Brasília Teimosa, na Zona Sul, com atrações que vão de DJs como Idlibra e Yuri Andrew à cantora de brega Eduarda Alves.


Como produtora independente, a Brota não deixa de estar sujeita às dificuldades presentes no país para iniciativas culturais do tipo. “É essencial que as marcas olhem para nossas festas. Quem tá ali são pessoas que movimentam a cultura, a economia, a sociedade, inclusive pessoas de personalidade e formadoras de opinião”, afirma Vands. “Ainda é bem difícil produzir de forma independente porque a falta de acesso e grana nos limita muito”.


A ligação com a comunidade LGBTQIA+ é uma característica intrínseca à produtora. “Tudo começa comigo sendo LGBTQIA+. A Brota é sobre quem eu sou e quem são os meus. Então tudo é pensado diretamente pra comunidade, sabe? A Brota é uma produtora LGBTQIA+”, destaca Vands.


"A gente quer abraçar todos os públicos justamente porque a ideia de pluralidade nos move. Mas nosso foco é na juventude preta, periférica e LGBTQIA+, inclusive é quem está também, dentro da produtora. E aí isso é colocado em pauta em tudo que a gente pensa, desde a criação das festas, do line, do preço do ingresso, a quem tá trabalhando com a gente. Também na inserção da Lista Trans Free [iniciativa de prevê a entrada gratuita de pessoas trans e travestis nos eventos]" – Vands

A dificuldade na produção das festas por conta da produtora abraçar a diversidade também é um importante ponto a ser destacado. “Faz pouco tempo que a gente [pessoas LGBTQIA+] começou esse domínio da cena, então ainda existem muitas pessoas no meio, que vem de antes disso com um olhar muito fechado ali dentro do seu preconceito, ou que não dá a mínima pra nossa luta e pros nossos objetivos. É difícil, mas só de ocupar o espaço que a gente tá ocupando, só de fazer eles nos observarem já é um começo e tanto”, aponta Vands.


Na opinião do produtor, o protagonismo de pessoas LGBTQIA+ na produção de festas é relativamente recente, mas vem se fortalecendo. “Antes quem dominava nossa cena era a elite branca e heterossexual que produziam pra gente, agora é diferente, a gente quem movimenta e tá começando a ditar o que vai ser feito. Então esse processo de adaptação é longo, mas tá rolando”, destaca o produtor.


A sensação de pertencimento para integrantes da comunidade é um tópico importante quando o assunto é o entretenimento LGBTQIA+. “O próprio público sente quando aquele lugar é seu, sabe? A gente enquanto produção também. Tem locais que eu produzi que não tenho mais vontade de voltar lá justamente por isso, por não me sentir pertencente".



Pertencimento é um dos pontos destacados pelos frequentadores. “É um lugar onde eu me sinto super confortável, de vir pra festa, saber que eu vou encontrar amigos aqui, que eu vou dançar sem problema com quem tá olhando porque eu basicamente conheço a pessoa, ou conheço tipo de rolê", afirma o PROFISSÃO Vinícius SBORENOME .


“A Brota, apesar de nichar seus eventos entre diversos públicos, se preocupa em ser inclusiva em todos eles. Não importa se é uma festa de house, uma festa de brega, uma festa pop ou um evento na rua, sinto que a inclusão está presente na alma da produtora e isso recai sobre a aura de tudo que ela faz”, opina o publicitário Gabriel, 24.


Vands destaca que o primeiro ano da Brota o surpreendeu positivamente. “Conseguimos firmar a produtora como uma das principais do circuito LGBTQIA+ da cidade, alcançamos muita gente massa e conquistamos um legado”, declara.


Ao fazer um balanço desse primeiro ano, o DJ ainda destaca que parcerias com o espaço Kilomburbano na Copa do Mundo 2022, o selo Golarrolê no Réveillon, e a participação no festival No Ar Coquetel Molotov como muito importantes para a produtora e para a cena noturna do Recife.


“Tivemos um primeiro ano de vida cheio de conquistas e a meta para 2023 é alçar vôos ainda mais altos e impactar muito mais a vida cultural e a juventude do Recife”, conclui o produtor.


Feita por pessoas LGBTQIA+ e para pessoas LGBTQIA+, a Brota Produtora é um dos exemplos de um protagonismo queer que vem se fortalecendo na cena noturna, ainda que tenha raízes antigas. Em espaços como esse, pessoas da comunidade que são negras e periféricas podem desfrutar de lazer, cultura, acolhimento e muito mais.


“É um lugar para você ser quem você é. Eu não sei se o local que a gente tá é muito receptivo disso. Recife não é o lugar mais aberto a experiências diferentes da hereronormativa e da cisgeneridade, mas eu acho que a gente pode mudar isso talvez, né? E acho que a Brota sabe esse caminho”, conclui o frequentador Humberto.


SERVIÇO


  • O que? Baile da Brota 1 ano

  • Quando? 20 de janeiro, às 23h

  • Onde? Arena Brota - Boa Vista, Recife (PE)

  • Quanto? R$ 35 via pix ou sympla + taxa



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