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Foto do escritorRayane Domingos

"Nosso Sonho" mostra como o poder da amizade e o funk salvam vidas

Atualizado: 28 de set. de 2023

A cinebiografia narra a história da dupla Claudinho e Buchecha, que fez parte do movimento do funk melody nos anos 90


Para quem não curtiu os bailes funks nos anos 90, há uma curiosidade sobre como os Mc's e duplas surgiram e conseguiram explodir nas rádios, carrocinhas de CDS e DVDs e na televisão. Dentre tantas histórias e estudos sobre como o funk melody revolucionou o cenário da música brasileira, o único fato concreto é que por trás de cada jovem negro e de periferia envolvido naquele movimento, havia um artista com muita vontade de expressar sua arte e, sobretudo, de viver um sonho.


Com direção de Eduardo Albergaria, 'Nosso Sonho' narra a amizade e a carreira de Claudinho (Lucas Penteado) e Buchecha (Juan Paiva), que fizeram sucesso no funk nos anos 90. A história começa no encontro entre eles, aos sete anos, e passeia pelos momentos de separação e reencontro durante a juventude até a decisão de formar a dupla.


No Morro do Salgueiro, Claudinho foi responsável por batizar e apresentar os bailes que aconteciam na comunidade a Buchecha. Foi ele que acreditou e persistiu no sonho do amigo em representar o lugar de onde vinham e de se tornar artista de funk. A vida os separou novamente, e para sempre, após um acidente trágico de carro em julho de 2000.



Levando as galeras a lutarem com firmeza, pela paz nos bailes, que curtir é uma beleza

- Claudinho e Buchecha em “Rap do Salgueiro”


Mesmo inserido na cena do funk nos anos 90, não existe uma preocupação da direção do filme em retratar as dificuldades dos Mc's em relação a gravadoras e divulgação do trabalho, ou da forte marginalização que o ritmo sofreu. O roteiro foca em contar a relação entre os amigos e como foi o início de tudo, com Buchecha escrevendo as letras enquanto Claudinho ditava o ritmo, e como os dois viveram o sucesso.


As cenas que recriam os bailes dos anos 90 são empolgantes e fazem com que o telespectador consiga entender um pouco como o envolvente funk melody dominou o cenário. A nostalgia também é usada para lembrar as músicas que faziam sucesso na época, como o 'Rap da Felicidade', de Cidinho & Doca, e até os bailes de corredor - em que havia enfrentamento físico de diferentes grupos. Os cenários e figurinos também ajudam na imersão, principalmente nas roupas usadas pelos personagens principais.


A direção teve um cuidado muito bonito de refazer as cenas de shows e programas em que Claudinho e Buchecha apareceram (a maioria está disponível no Youtube). O figurino abusando de camisas de times, peças oversized, jaquetas, óculos e bonés foi importante para aproximar o público da telas para a vida real. O jeito despojado e pioneiro dos dois, que fizeram a própria moda, também foi destacado em cena.


Nossa história vai virar cinema, e a gente vai passar em Hollywood

- Claudinho e Buchecha em “Coisa de Cinema”


O maior acerto do filme é, sem sombras de dúvidas, o elenco talentoso. O maior destaque vai para Juan Paiva e Lucas Penteado, que imprimiram muito carisma e sintonia, da mesma maneira que Claudinho e Buchecha transpareciam na época.


O fato deles serem parecidos ou não com os cantores de nada importa, uma vez que os dois conseguem retratar nitidamente a parceria e sinergia que os dois tinham tanto na vida particular quanto nos palcos. O fato de Juan e Lucas cantarem todas as músicas, dançarem em todas as performances e se jogarem de verdade em cena fez toda a diferença.


Tatiana Tibúrcio, como Dona Etelma, e Nando Cunha, como o Buchechão, mãe e pai de Buchecha, respectivamente, também valem o destaque. A atriz consegue emocionar e deixar o público tenso em uma cena específica, e transmite a força e doçura de uma mãe da periferia que busca dar o melhor para o filho.


A atuação de Nando também é um grande primor. Ele tem mais tempo de tela e faz o contraponto dos momentos de felicidade e harmonia na vida de Buchecha. O ator consegue imprimir em cena as complexidades de um homem alcoólatra, artista que não conseguiu alcançar o sucesso e um pai que quer ensinar sobre a vida ao filho.


Amor sem beijinho, Buchecha sem Claudinho, sou eu assim sem você

- Claudinho e Buchecha em “Fico Assim Sem Você”


O filme segue a linha de contemplar os momentos de felicidade da dupla ao invés de citar os problemas que eles tiveram ao longo da caminhada. Os conflitos não acontecem entre os dois amigos, e sim na relação complexa entre Buchecha e o pai. Claudinho entra como uma espécie de apaziguador, a todo tempo, dos ruídos que aconteciam entre eles.


A direção peca ao se prender na perspectiva de Buchecha sobre todas as situações e não relata mais detalhes sobre a vida de Claudinho. O cantor foi reverenciado a todo tempo como um homem que impulsionava o outro, mas o público não se sente tão próximo para saber por quais motivos ele acreditava no sonho de viver da música.


Foram poucos momentos em que Claudinho protagonizou realmente a narrativa do filme. Por decisão familiar ou da direção, não é citada a relação dele com os parentes, que eram suas referências, ou como ficou a vida após a fama.


Apesar disso, o filme não perde a profundidade ao mostrar com muito afeto a construção dessa amizade e como isso, aliado a oportunidade, talento e uma cabeça cheia de sonhos, revolucionou a música brasileira na década de 90.


Veredito: 4/5

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