Os Jogos Paralímpicos e a desvalorização da mídia e do público
Apesar da falta de uma transmissão digna, a culpa recai para o público, que também ignora os paratletas ou ainda o veem como pessoas menores
Os Jogos Paralímpicos de Paris chegou ao fim no último domingo (8) com o Brasil sendo um dos grandes destaques. A meta de ficar no Top 5 do quadro geral de medalhas era um sonho difícil, mas os nossos paratletas conseguiram esse grande feito. Apesar dos momentos de muita felicidade, por mais um ano a competição sofreu com negligência tanto por parte da mídia quanto pelo público.
A cada quatro anos a expectativa para os Jogos Olímpicos se multiplica no país com os principais veículos de mídia, e o público, dando atenção e reverência aos atletas que vão competir. A cada edição tenta-se aumentar o número de horas transmitidas da maiorias das modalidades, com prioridade para as que o Brasil esteja competindo.
A TV Globo detém os direitos da televisão aberta e fechada (canais pagos), e teve 200 horas de transmissão, em quatro canais dedicados exclusivamente para as Olimpíadas, com detalhe para exibição em 4K. Além disso, teve coberturas completas em tempo real no site GE.
Fora os programas dedicados para o pós-jogos, como o Central Olímpica e o Çava Paris (canal fechado + streaming). Fora os pequenos boletins de informações nos principais telejornais do país.
A CazeTV foi a novidade para o ano Olímpico, em parceria com a Livemode, com transmissão exclusiva e de graça na internet, no caso Youtube e Twitch. Foram quase mil horas de programação, com prioridade para as modalidades em que o Brasil tinha representante.
Os programas de pós-jogos também foram destaque e iam ao ar após o dia cheio de histórias para contar aos atletas. Apesar de menos profissional, por trocar repórteres por influenciadores, a cobertura foi destaque pela facilidade para assistir.
A diferença das Paralimpíadas
A Globo foi a única detentora dos direitos para transmitir as Paralímpiadas no Brasil, tanto pela televisão aberta quanto pela fechada. A princípio, a emissora tinha dedicado apenas um canal, o SportTV2, para exibir algumas modalidades. Também teve programas pós-jogos, mas de uma maneira menos expressiva como foi nas Olimpíadas.
O abismo de diferença chamou a atenção do público que estava acostumado a acompanhar também pelo Youtube oficial do Canal Paralímpico. A notícia de que a Globo teria proibido a exibição gratuita pela plataforma se espalhou nas redes sociais e logo foi negada pela emissora:
"Não procede que a Globo bloqueou ou tenha pedido bloqueio de sinal de transmissão para o YouTube do Comitê Paralímpico Internacional. Pelo contrário. Como prevê o acordo, a Globo tem direitos exclusivos dos Jogos, que foram sublicenciados para o CPB [Comitê Paralímpico Brasileiro] para que eles possam explorar em suas redes de maneira customizada. E o que não estiver sendo exibido no SporTV ou na TV Globo estará disponível no YouTube do IPC. Então, o público tem acesso a toda a competição", dizia o comunicado enviado a Folha de São Paulo.
O Comitê Paralímpico Internacional (CPI) informou que a transmissão no Youtube para o Brasil estava proibida porque, por contrato, a Globo é a única que tem os direitos de transmissão.
"Em alguns mercados, precisamos fazer geobloqueio. O Brasil é um. Outros são o Reino Unido, os Estados Unidos e vários outros países, cerca de 20 a 30 mercados que precisamos geobloquear, pelo acordo do YouTube. O Brasil é, infelizmente, um deles. Mas a Globo está mostrando uma cobertura abrangente em cada um dos canais", disse o assessor de comunicação da Craig Spence, a Folha.
Após muitas reclamações e protestos nas redes sociais, a Globo liberou o sinal no Youtube para as modalidades que não estavam sendo exibidas pela emissora, mesmo assim não foi para todas que o Brasil esteve em disputas. Além disso, o Globoplay abriu canais extras quando teve o Brasil competindo em provas que poderiam resultar em medalhas.
Outro erro da emissora foi dar selecionar quais as modalidades que ia exibir, ao invés de trazer todas. O Brasil marcou presença em 20 dos 22 esportes dos programas dos Jogos. Os telespectadores não puderam assistir a disputa da Bocha, por exemplo, que teve muitos brasileiros em disputa. Ao invés disso, tivemos jogos de outros países sendo exibidos.
A CazéTV foi questionada sobre o motivo para não conseguir exibir e foi informado que na época, os direitos de transmissão não estavam disponíveis. A cobertura do canal foi nas redes sociais, com eles dando destaque para os feitos dos paratletas.
De quem é a culpa?
É importante destacar que apesar da transmissão ter sido menor por parte da Globo, ela foi feita com excelência e informação. A emissora escolheu a dedo os narradores e repórteres para fazerem a cobertura, sendo a maioria rostos conhecidos do público e dos atletas por acompanhar os esportes paralímpicos. Mesmo com todo esse cuidado é preciso refletir sobre como a emissora ainda “esconde” um produto adquirido de forma exclusiva.
A diferença entre cobertura Olímpica e Paralímpica fica ainda mais expressiva a cada ano que passa, principalmente quando falamos sobre exibição da televisão aberta. A ideia de que o público ainda não está preparado para ver pessoas com deficiência vencendo, é antiquada e pouco educativa para os padrões televisivos.
A crítica é válida para a grande mídia no geral, que ainda não dá o destaque que as Paralimpíadas merecem, mas também para parte do público que evita ou nem busca prestigiar a competição em si. O capacitismo ainda é algo presente e domina a maioria dos comentários nas redes sociais, sempre disfarçados de buscar informações para saber "a história triste por trás dessa deficiência".
Esse tipo de comportamento limitante, dos dois lados, reforça a ideia de que Jogos Paralímpicos só precisa fazer parte da bolha de quem realmente o acompanha, tirando a essência de caráter universal do esporte.
Em um contexto geral, a culpa precisa recair nas emissoras que fazem pouco caso da competição, nas redes sociais que evitam repercurtir publicações sobre os Jogos e muitas das vezes, e sobretudo, nas pessoas que ainda são capacitistas e preconceituosas com as pessoas com deficiência.
Desempenho do Brasil nas Paralimpíadas
O grande objetivo do Comitê Paralímpico era ficar no Top 5 do quadro de medalhas. O sonho era difícil demais, sobretudo pelo alto nível dos outros países, mas a esperança nos nossos atletas foi bem maior. O Brasil terminou em 5º lugar, com 89 medalhas conquistadas, sendo 25 de ouros, 26 de prata e 38 de bronze.
Os números são inéditos, tanto pela quantidade geral de medalhas quanto pela quantidade de ouros conquistados. Os números superaram as ótimas campanhas em Tóquio 2021 e na Rio 2016.
A delegação brasileira teve 280 atletas, sendo 255 atletas com deficiência. O número de mulheres ainda foi abaixo, com 117 representantes contra 138 homens. Porém, foi a maior participação feminina do Brasil em Jogos Paralímpicos.
E como esperado, elas dominaram a maioria das provas e belas histórias durante toda a campanha. As mulheres foram as responsáveis por conquistarem mais ouro do que os homens para o Brasil nesta edição. Foram 13 medalhas contra 12 dos homens.
A TAG Revista fez toda a cobertura dos Jogos Paralímpicos nas redes sociais (Twitter/X, BlueSky e Threads) e colocou alguns destaques no post abaixo:
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